terça-feira, 30 de novembro de 2010

Go away II (too)

Judith,

Você me põe a pensar (e a falar) quando tudo o que eu quero é ir à praia. Minhas viagens, aliás, me tiram um pouco aquela velha mania de permanecer. Você não sabe, mas antes a idéia de partir era insuportável por aqui, porque enquanto estivesse fora o mundo aconteceria sem mim. A cidade, as ruas, as pessoas. Agora o anonimato me chama. Cidades, ruas e pessoas novas. O querer dói, não dói, Judith? Você sabe. Mas é querendo que a gente vai.

Eu achava que tudo permanecia e você me ensinou a ir embora. Deixa eu te ensinar a ficar um pouco, Judith, porque nem tudo é de deixar para trás. Algumas coisas (e cidades e pessoas) a gente pode levar com a gente para onde for. Lembra de Dindí? Dindí sempre me diz que gostaria de poder voltar de vez em quando. Eu levo Dindí comigo porque enquanto estava aqui era parte de mim. E levo João comigo também, porque João merece ficar mais um pouquinho. E levo José, porque José eu inventei todinho.

Se você quiser, Judith, eu levo você também.
Mas eu já não fico mais.
Um beijo,
Maria.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Sabedora

O (O)outro é muito silencioso.
Eu gosto é de palavra.
Talk to me, please.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Quarta de cinzas

"E a fantasia vai voltar pro barracão..."

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

De amores

Querida,

Você me perguntou um dia quando é que a gente sabe que está preparada para voltar a amar. E naquela época eu não estava muito em posição de responder. Hoje eu começo a supor que a gente está preparada para voltar a amar quando, de repente, não se pergunta mais se está preparada.

Um dia o telefone toca e quando você se dá conta está morrendo de palpitações.
E no dia seguinte não está mais.
E no dia seguinte quase morre de palpitações.
E no dia seguinte...

"O amor é uma agonia
Vem de noite, vai de dia
É uma alegria e, de repente,
Uma vontade de chorar..."

domingo, 14 de novembro de 2010

Em resumo:


"Afinal, deste dia fica o que de ontem ficou

e ficará de amanhã:
a ânsia insaciável e inúmera
de ser sempre o mesmo
e outro."

Bernardo Soares

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Com fantasia

Ah, Judith...

Começo a achar que é bobagem nossa dar tanto ouvido a essa senhorinha cheia de conselhos sobre como devemos e não devemos nos portar nas nossas incursões amorosas.
José, por exemplo, já perdeu todo o tom aventureiro e eu juro que não tenho nada a ver com isso. Desconfio de que ele, tal qual João - veja que grande coincidência -, tenha milhões, trilhões, zilhões de medos. Assim como você (e eu). E se ele me acompanha com aqueles olhos vivos é porque ele me acha bem audaciosa. Mas não sabe bem que tipo de audácia me toma. E eu, nessa nova fase, não digo. E também não é por já não ser mais dizedora, mas por saber que quando se trata do amor aquele negócio de vem, mas vem sem fantasia é papo furado.
Pra José ser José ele precisa ser aventureiro. E ter olhos vivos e me rodopiar na Vinícius de Moraes. E eu não quero saber tanto assim de todas as marcas que ganhou. José tem que me deixar imaginar um pouquinho mais. E saber um pouquinho menos. Porque o encanto está no mistério das cousas, diria o poeta (e também um senhor bem sábio que conhecemos outro dia).
Das fantasias a gente pode rir um pouco mais durante o jogo.
Depois de um chopp eu aposto que fica ainda mais fácil rir dessas coisas.
Até mais tarde,
Maria.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Sem fantasia

Judith,

Ouvindo você falar da concretude dos planos fiz de você melhor interlocutora do que João, que não tem falado coisa com coisa. Ele agora deu para ensaiar me dizer umas palavrinhas, mas ele sabe que eu não sou mais aquela dizedora desenfreada de antes. Ele sabe que as coisas por aqui mudaram um pouco. E se eu mando carta e ele me responde telegrama, é porque as coisas por lá são as mesmas, as mesmas, as mesmas.

Acho que você gostaria de José.
José parece ter aquilo sobre o que falávamos outro dia, aquela marca de quem sabe o que é perder e quando ganha uma coisa nova não fica delirando que é coisa que basta. Ele já descobriu que não vai bastar e não se afoba mais. Com uns olhos bem vivos, José me acompanha enquanto me acomodo no carona e fecha a porta com delicadeza, como quem termina um movimento de dança. Por falar em dança, ensaiamos uns rodopios lá na Vinícius de Moraes (só agora me dei conta da poesia que é rodopiar por aquelas ruas). Ele me conta das marcas que ganhou (nas lutas contra o rei, nas discussões com Deus) e desliza pelas aventuras que já viveu. Nem sei se foram tantas, mas gosto de pensar que sim.

José é meio estrangeiro, sabe, Judith? E posso estar bem enganada, mas acho que ele quer achar um lar. (Mas eu tenho mania de inventar as pessoas...)

Um beijo,
Maria.