segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Adiamento

Quando entre uma cerveja e outra ela me perguntou do que eu mais sentia falta, não pude conter a língua na boca porque aquelas lembranças estavam martelando há dias e eu só sabia pensar nas mãos dele escorregando pelas minhas costas enquanto me ouvia falar as bobagens de sempre e em como ele dedilhava nas minhas coxas, disfarçadamente, ali mesmo, embaixo da mesa. Eu contei para ela duas ou três indecências que ele costumava dizer quando ninguém mais estava ouvindo e que isso nada tinha a ver com sexo, com a trepada propriamente dita. Ele falava indecências como quem elogia a roupa. E eu tinha saudade nem era das indecências, mas da graça que eu achava desse poder que ele tinha de fazer arrepiar a perna certa na hora mais errada. Havia um momento em que eu era sempre enfática e ele sempre meio apavorado. Em que eu queria e ele fugia. E eu esbravejava mas acho que, no fundo, tinha um prazerzinho em chocar. Um certo prazerzinho em vê-lo fugidio assim, como sempre. Hoje eu até penso que ele também gozava assim, adiando.
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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

As armas de Jorge

Escolhi um santo bem pequeno, cujo rosto não se distingue, que é pra poder ser o santo que você quiser. Combinaria com a gente um Santo Expedito, pras causas justas, impossíveis e urgentes - como as nossas. Tinha um de cada lado e eu não acredito, mas falam que assim você está rodeado de proteção. Lembro, mesmo com tão pouca fé, de São Jorge de repente e escapolem uns versos da minha boca. Quero que meus inimigos, tendo pés, não me alcancem. Tendo mãos, não me peguem. Tendo olhos, não me enxerguem. São Jorge, sim, seria um bom santo pra você carregar aí no peito. Porque Jorge foi insistente como eu mesma sou em excesso - e você, tão pouco.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Começo

Judith,

Hoje é dia três de janeiro de dois mil e doze. Muitos anos se passaram até que inventassem as palavras e muitos outros até que nós (você e eu) pudéssemos fazer (bom) uso delas. E bom é te escrever e te ler, porque você escreve sobre você mas é também sobre mim - embora você não perceba. E eu escrevo sobre mim, mas hoje é pra você.

Quando um ano começa, a gente também começa junto com ele. Eu, pelo menos, suponho que posso começar diferente e mesmo que me perca pela metade do caminho (lá pra julho), foi-se meio ano e pronto. Quem dirá o contrário? Renovo alguns planos e crio metas que sei que precisam de mais de um ano para serem cumpridas, mas a função da meta é estar lá. Vislumbro novas construções e quando rezo é pra pedir saúde, porque com saúde a tristeza e a angústia não matam nem engordam.

Remar é pra frente, por falar em chuva.
Sorte.
Um beijo.
Fernanda.