quinta-feira, 22 de setembro de 2016

O que aprendo com Angela

Encontro Angela semanalmente após o almoço. Ela se levanta meio lenta (a pressa é um problema todo meu) e me recebe com um sorrisão, pergunta se já almocei. Angela me descreve sua marmita do dia, seu peristaltismo (mas não chama assim) - pra ver se finalmente entendo que nosso horário de sempre é péssimo-, e me mostra as últimas cores lançadas. Quer saber se meu humor está para o azul claro da revista. Digo que não. Nude. Ela ri. 

Angela me mostra a foto de seu neto e de suas filhas adolescentes, que agora vendem Avon - caso eu queira conferir as ofertas. Já conheço sua história de luta e de como fez para vir da Bahia sozinha com as meninas depois que o marido foi embora. Mulher forte. Pergunto pela nona vez, apesar de saber, de que cidade mesmo Angela veio, só porque gosto de como ela resgata seu sotaque lindo para me dizer. Tem que ir lá, Nanda. Terra boa!

Angela faz unhas e massagens. Agora também está aprendendo a fazer drenagem linfática, e está encantada pelo fato de o corpo acumular e expelir toxinas. Acha o corpo uma máquina das mais porretas. Eu concordo. Ela é muito boa no que faz. Mais de uma vez falei que ela merece um espaço só dela, que aquela porcentagem não é justa - mas a pressa continua sendo toda minha. Angela diz que tudo tem seu tempo e que, acabando o curso de cupcake da caçula, a renda vai aumentar. Se pudesse, vivia era de fazer cocada. Tem mão boa pra isso. Salivo ouvindo sobre os sete ou oito sabores mais vendidos. 

Conto para Angela minhas últimas aventuras e ela se esquece das cutículas, rindo-se  toda e dizendo quantos ôxes são possíveis de se ouvir numa aventura tão breve. Ela diz que a mulher precisa ser amada, senão o corpo enferruja e isso não é bom pra saúde. Por falar em saúde, achou minhas mãos pouco hidratadas e recomendou beber mais água. Ou suco. Refrigerante não, que acumula toxinas.

Baixinho, conta que ela mesma tem encontrado um galego depois das dezoito e que tá é bom. Comemoro, meio boba, querendo ver Angela bem, e ôxe! Manda eu deixar de ser besta. Aquilo ali é só farra. Do marido, só sentiu falta da máquina de ralar coco. Tem que provar dessa cocada que eu sei fazer. 

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Para Malu Chegar.

Maria Luísa, minha sobrinha
Você ainda nem nasceu e já está na família há meses. Eu disse meses, mas talvez esteja há anos, muitos anos, quando Paula e eu brincávamos de boneca e não sabíamos que tratava-se de uma antecipação. E se não for de tão longe, será pelo menos desde que, passeando pela Praia de Itapoã, seus pais brincaram com alguma outra criança suja de areia, precisando de protetor solar, enfrentando o medo do mar.
O mar. Você vai conhecer o mar logo, logo. Talvez antes de aprender a andar, já terá aprendido sobre as profundezas, sobre desviar das ondas, sobre fugir dos perigos. Preste atenção, ensinamentos de mar são importantes e serão úteis por toda a vida. Até que tenha coragem para enfrentar os perigos sozinha, não faltarão mãos enlaçadas às suas, nem o olhar atento de vó ali da beira, pronta.
E por falar em perigos, Malu, não se assuste com o que vou dizer: serão muitos. A vida é cheia deles para quem se arrisca. Sua mãe diz que você é delicada, porque ali de dentro você se faz sutil em sua presença. Delicada é bom. Que a delicadeza não te falte nunca, no olhar para as pessoas, nos seus movimentos, nas palavras que saem de sua boca. Que seja possível manter a delicadeza mesmo quando a vida exige que a gente berre. E que seja possível ser firme sem perder a doçura e forte sem perder a graça.
Que tenha saúde, Malu, saúde sempre. E que tenha alegria com coisas simples: vendo uma fileira de formigas, o sol se pondo no horizonte, pintando os desenhos do seu pai, sentindo os cheiros que saem da cozinha da vovó.
Aqui a espera é muita. Estamos cheios de planos e ansiosos para ver você crescer e ter os seus.
Amor,