sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Enxurrada

Porque o ano acaba hoje, é permitido andar na chuva e sentir a água batendo de leve, abrindo os pulmões. E porque o ano acaba hoje, ainda molhada abri o jornal para ver meu horóscopo e, antes de saber que as protetoras vibrações de Júpiter atingirão harmoniosamente o meu signo e que o encontro com Saturno me aconselha a viajar, antes de saber tudo isso, vi mais chuva. E senti uma tristeza grande por não saber para quem perguntar por que tanta perda?, eu que já ando sem fé. As pessoas acabarão o ano sem casa, meu Deus. E sem marido e algumas sem filhos. Sem os dois únicos filhos. E de repente me lembrei do cachorro que no outro dia foi jogado da ponte uma, duas, três, quatro vezes pelo dono. Ele não queria morrer.

Acho que Deus anda jogando seus filhos da ponte também. É pecado pensar assim? Nós estamos nadando, nadando exaustos, porque nós também não queremos morrer. Temos sido fortes acordando todos os dias e relançando o desejo. Temos sido corajosos encarando o furo e bordeando o vazio com (essas) palavras. Será que o cachorro, não sabendo falar, na quinta vez se deixaria levar pelas ondas? Não quero pensar.

Quero só as vibrações protetoras de Júpiter, mesmo sem acreditar em vibrações e quase nem acreditar em Júpiter. Vou jogar de novo a rosa vermelha pra São Jorge, pra que meus inimigos tendo pés não me alcancem. Vou jogar de novo a rosa branca para Iemanjá, que não gostou quando da última vez eu disse que era encomenda pra Santo Antonio. Santo Antonio também não gosta de brincadeiras e, pelo visto, nem de rosas brancas.

E se o all star vermelho me fez andar diferente, vou tentar agora óculos novos, pra ver a vida de outro jeito. Vamos ver se funciona.

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